Brasil tem chance histórica de prosperar com a nova revolução industrial

Pronta 3a
Paulo Ricardo Stark, vice-presidente da Câmara Brasil-Alemanha de São Paulo e CEO da Siemens Brasil

O futuro da indústria já começou. A confluência de tecnologias diversas relacionadas à automação, internet e a utilização de sensores, RFIDs e de softwares avançados incorporaram ao nosso vocabulário termos como Big Data, Internet das Coisas e Fábrica Virtual.  Esse processo não nasceu de um dia para o outro. Ele se deu ao longo das últimas décadas e se caracteriza como uma evolução com consequências revolucionárias. 

Uma das grandes lições que as maiores economias globais tiveram nos últimos anos é que a indústria tem um papel essencial no desenvolvimento e estabilidade econômica.

Países que investiram em um setor industrial altamente competitivo, agregando novas tecnologias voltadas à eficiência, ancorados numa mão de obra altamente qualificada, conseguiram bons resultados e até prosperaram, como a Alemanha, que é hoje um dos maiores exportadores globais.

O exemplo alemão inspirou outros países, como os Estados Unidos, a Itália, e o Japão, que trouxeram de volta alguns setores de produção que estavam alocados em outros países.  A razão é simples. A crise econômica global da última década deixou claro que a indústria é importante para as economias nacionais. Mas seria o retorno da mesma indústria de antes, baseada simplesmente na produção de produtos em escala, sem grande valor agregado? A resposta é não. 

Uma nova indústria está nascendo e, com ela, novos conceitos e modelos de negócios.

Baseada na integração entre sistemas digitais, mecânicos e de automação, a chamada quarta revolução industrial estabelece novos paradigmas de produção. As fábricas passam a ser mais flexíveis e eficientes, unindo rapidez, baixo custo e níveis mais elevados de qualidade, promovendo novos empregos, altamente qualificados. Customização em massa é uma das demandas para a nova indústria.

Nesse cenário não muito distante, as pessoas vão trabalhar na criação de produtos customizados, no desenvolvimento de aplicações de software e em atividades não corriqueiras de alto valor, como manutenção remota e planejamento. O operário do futuro não irá operar máquinas ou se dedicar a tarefas repetitivas. Seu foco vai estar em criar produtos e aplicações, em garantir o bom funcionamento da produção, monitorando e interferindo quando necessário.

Pode parecer ameaçador a um olhar viciado nos sistemas tradicionais de produção. Mas isso se olharmos com os olhos do passado. O que na verdade surge é uma oportunidade em favor do Brasil, pois o aprendizado de software e sistemas é muito mais acessível do que o aprendizado para operação. Com o amplo acesso à informação e a universalização dos smartphones, qualquer cidadão poderá aprender, sem precisar se deslocar por horas, usando sistemas totalmente virtuais e simulados, portanto sem a necessidade de investimento em equipamentos caros e inacessíveis. É a inclusão total. E se percebermos isto rápido o suficiente, o Brasil pode tomar uma posição de liderança nesta transformação.

Considerada a melhor fábrica da Europa, com os maiores índices de eficiência e produtividade da Alemanha, a Siemens Electronics Manufacturing Plant, em Amberg, é um exemplo prático dessa nova manufatura. Com digitalização de ponta a ponta, a unidade possui a maioria dos processos interligados e gerenciados de forma digital, com uma taxa mínima de falhas. Desde sua fundação, em 1989, a produção aumentou oito vezes sem necessidade de expansão do espaço físico. Por isso, ela é apresentada como um símbolo da Indústria do Futuro no país e vem colecionando inúmeros prêmios.

Em Amberg, a produção é automatizada em grande parte. Máquinas e computadores manipulam 75% da cadeia de valor de forma autônoma. Os outros 25% são efetuados por funcionários. Os produtos controlam a sua própria fabricação, por meio de um código de identificação, e informam às máquinas sobre suas necessidades e quais etapas de produção serão obrigados a seguir.  Essa é uma amostra do que deve prevalecer na indústria global nos próximos anos.

Na Alemanha, onde o termo “Indústria 4.0” foi criado, há uma coalizão entre governo, empresas, universidades e associações de classe para tentar aumentar ainda mais a competitividade local.

E a digitalização atende esse anseio. Uma pesquisa da PricewaterhouseCoopers com 235 empresas globais mostrou que o investimento em tecnologias digitais resultou em um aumento de eficiência médio de 20%.

Um estudo realizado pela consultoria Booz & Company para World Economic Forum’s Global de 2013 mostra que um aumento de 10% nos investimentos dos países em digitalização resulta em um aumento de 0,75% de PIB e diminuição de 1% na taxa de desemprego. Segundo o relatório, essas tecnologias já resultaram nos últimos anos na criação de 400 mil empregos altamente qualificados na Europa e Estados Unidos e 3.5 milhões de empregos na região da Ásia-Pacífico.

No Brasil, temos ainda o desafio de aumentar significativamente nossa produtividade para sermos mais competitivos na cadeia global. Dados da publicação Eurostat de 2013 sobre o PIB gerado por hora trabalhada mostram que na Alemanha esse índice é de 57 USD/hora. Nos Estados Unidos, 67 USD/hora, e no Brasil, e 10 USD/hora.

É cada vez mais evidente que o desenvolvimento sustentável do Brasil passa por uma mudança de mindset.  A indústria é um segmento estratégico para nosso desenvolvimento e seu efeito na cadeia de valor não é igualado por nenhum outro setor da economia.

Para o Brasil e seu setor industrial, essa pode ser a oportunidade de saltarmos etapas, partindo direto para este novo modelo, evitando os investimentos altíssimos e recursivos que os desbravadores tiveram que fazer ao longo destes anos da era da automação, mas investindo numa automação leve, flexível, eficiente e digital. Mas precisamos criar as plataformas para educar nesse novo paradigma, de total inclusão e acessibilidade, despertando o interesse das pessoas pelos novos horizontes e espantando o medo da mudança. Caso contrário, a perspectiva é de nos distanciarmos cada vez mais dos países desenvolvidos e retroagirmos economicamente, com altos custos sociais, desemprego e novas décadas perdidas.

O poder disruptivo da quarta revolução industrial é evidente. Depende de nós visualizarmos as perspectivas e tomarmos as rédeas do nosso futuro em nossas mãos ou corremos o risco de ficar perigosamente para trás.